Acordo obtido pelo Ministério Público de Goiás (MPGO) e o Centro Judiciário de Soluções de Conflitos em 2º Grau (Cejusc) por meio de autocomposição e já homologado pela Justiça vai garantir estrutura e condições dignas de trabalho a cerca de 40 famílias de catadores de recicláveis que vivem ou trabalham no lixão de Formosa. O ajuste que estabelece medidas para essa organização socioeconômica dos catadores foi firmado entre o MPGO, o município de Formosa e as famílias em audiência realizada na comarca na última quarta-feira (10/9).
O acordo foi articulado pelo MPGO por meio do Centro de Autocomposição de Conflitos e Segurança Jurídica (Compor) e da 6ª Promotoria de Justiça de Formosa, que tem como titular a promotora Andrea Beatriz Rodrigues de Barcelos, em atuação conjunta com o Cejusc 2º Grau do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO). A mediação ocorreu a partir de solicitação da desembargadora Sirlei Martins da Costa, relatora de um recurso interposto pela 6ª PJ de Formosa visando obter a realocação das famílias que vivem no lixão e a concessão de moradias dignas.
As cláusulas foram negociadas pelo MP e o Cejusc ao longo de três audiências no curso do processo, mas a concretização do acordo ocorreu efetivamente durante a audiência ocorrida em Formosa, a qual contou com a participação decisiva das catadoras e catadores diretamente interessados. Como ressalta a promotora de Justiça Andrea Barcelos, foi neste momento que as famílias puderam expressar suas necessidades, pedindo condições dignas de trabalho, incluindo maquinário.
Saída dos moradores do lixão é um dos compromissos previstos
Entre as obrigações assumidas pelo município de Formosa no TAC estão a criação e regularização da cooperativa de catadores; a disponibilização de infraestrutura adequada para a triagem e reciclagem; o fornecimento de equipamentos de proteção individual e caminhão para a atividade produtiva, além da implementação gradativa da coleta seletiva no município, com priorização da contratação da futura cooperativa.
Também estão previstas medidas de assistência social, saúde, escolarização e capacitação profissional para os catadores e suas famílias, incluindo a inserção em programas de aluguel social da Agência Goiana de Habitação (Agehab).
As famílias comprometeram-se a participar do processo de constituição da cooperativa, a desocupar as moradias irregulares no entorno do lixão (são 9 famílias nesta situação) e a aderir aos programas de assistência e capacitação. Caberá ao MPGO acompanhar a execução do acordo, com possibilidade de inspeções, reuniões de monitoramento e requisição de relatórios periódicos.
Andrea Barcelos observa que ficou acertado ainda que será buscado apoio financeiro para a cooperativa, em articulação do MP, Ministério Público do Trabalho (MPT), Organização das Cooperativas do Brasil (OCB) e município de Formosa.
O cumprimento das cláusulas será acompanhado por relatórios periódicos a cada 60 dias, que deverão ser apresentados pelo município ao MP. O acordo prevê multa diária em caso de descumprimento.
Audiência com famílias foi decisiva
Coordenadora do Compor, a procuradora de Justiça Laura Maria Ferreira Bueno explica que a participação do Centro de Autocomposição na resolução da demanda foi consequência de um trabalho em conjunto com o Cejusc 2º Grau, que já vem ocorrendo há algum tempo. Esse apoio também teve a anuência da promotora responsável pelo caso.
Foram realizadas três audiências de negociação, duas delas no Tribunal, em Goiânia, e uma virtual, em busca da composição. Foi aí que veio a sugestão da promotora Andrea Barcelos para a audiência em Formosa, com a participação das famílias, pois seriam elas quem melhor poderiam avaliar os termos de um possível acordo.
Além das catadoras e catadores, essa audiência teve a participação das promotoras Andrea Barcelos e Marta Moriya Loyola, integrante do Compor; do promotor Rafaello Boschi Isaac, também do Compor; do procurador-geral do município de Formosa, Bruno Batista Lôbo Guimarães; da subprocuradora do município, Bianca Castro Valadares Bittar; de representantes da assistência social de Formosa e da Agehab, e mediadoras do TJGO.
Ao comemorar o acordo obtido, Andrea Barcelos destaca a importância do apoio do Compor e da mediação do Cejusc para o resultado favorável. Ela ressalta ainda como fundamental a participação das famílias na construção da solução. “Apesar de tantas violações de direitos fundamentais, estas famílias foram ouvidas, se sentiram parte na construção do acordo, e demonstraram a esperança de que ele será cumprido. E o Ministério Público permanecerá atento ao seu cumprimento integral, até que os catadores de materiais recicláveis de Formosa formem uma cooperativa e tenham condições dignas de trabalho e renda.
A desembargadora Sirlei Martins da Costa, relatora do processo, também enfatizou o esforço de todos os envolvidos na solução de um problema de grande complexidade e a escuta daqueles diretamente interessados. “O diferencial desse acordo é que os principais interessados na solução do problema tiveram voz ativa, saíram do lugar de substituídos processuais para se posicionarem sobre os rumos do acordo, de maneira que, dentro do possível, seus anseios serão verdadeiramente atendidos”, pontuou.
Além dos já mencionados, participaram ainda do processo de autocomposição o subcoordenador do Compor, Reuder Cavalcante Motta; o promotor de Justiça Márcio Lopes Toledo, também integrante do Compor, e o grupo de catadoras e catadores de materiais recicláveis, composto por Adelcio Correia da Silva, Andreia Ribeiro, Carlos Roberto da Silva, Claudio Domingos de Souza, Cristiano Barbosa Batista, Danielle Cristina do Carmo Rocha, João Alison F. do Nascimento, Kailane Barbosa Batista Madureira, Karolyna Batista da Silva, Maicon Douglas do S. Santos, Raiane Barbosa Batista, Simone Aparecida, Suzana Batista, Vanusa P Silva e Zilda Neves da Silva.
Entenda o caso
A demanda envolvendo as famílias de catadores de materiais recicláveis de Formosa teve início com o ajuizamento de ação civil pública pela 6ª Promotoria de Formosa visando à realocação de nove famílias que viviam na área do lixão e a concessão de moradias dignas. Como relata a promotora Andrea Barcelos, ela recebeu um ofício da área de assistência social do município, relatando as condições insalubres no local.
Após diligência, detalha, o oficial de justiça constatou que as famílias residem a menos de 150 metros do lixão, descumprindo norma técnica que exige distância mínima de 500 metros de aterros sanitários.
Na ação proposta, o MP requereu a concessão de liminar para regularização da situação, mas o pedido foi negado em primeiro grau. Assim, foi interposto recurso (agravo de instrumento) no Tribunal de Justiça, com relatoria da desembargadora Sirlei Martins da Costa, que resolveu encaminhar o caso para mediação pelo Cejusc e pelo Compor. Com essa ampla articulação, foi possível chegar ao acordo celebrado no dia 10 e já homologado pelo TJGO.
Fonte: MPGO