O empresário apontado como pivô do escândalo de grilagem de terras em Formosa (GO) acabou preso, nesta quarta-feira (16/8), no Rio Grande do Sul. D’Artagnan Costamilan, 72 anos, estava foragido desde 10 de julho, quando teve pedido de prisão preventiva decretado pela Justiça.
Ele foi preso em decorrência de uma investigação do Ministério Público de Goiás (MPGO) chamada Escritório do Crime. O órgão analisou escrituras, interceptações telefônicas e uma vasta quantidade de provas para pedir à Justiça mandados contra 13 pessoas físicas e jurídicas.
O caso vinha envolvendo políticos, uso do poder público, ameaças de morte e fraude de documentos de falecidos. Três ex-vereadores, suspeitos de legislarem e atuarem em benefício exclusivo do empresário, também estiveram na mira da operação.
A prisão foi cumprida pela Delegacia de Capturas (Decap) da Polícia Civil do Rio Grande do Sul. Natural daquele estado, D’Artagnan estava no município de Santa Catarina (RS). Ao Metrópoles, a defesa do empresário justificou que ele não se entregou antes porque o pedido de prisão seria ilegal.
“A prisão foi decretada há alguns dias, então era inevitável. Mas vamos revogar. É uma prisão ilegal, porque é desnecessária. Ele é primário, sem antecedentes criminais, todos os problemas são de natureza cível e estão ajuizados e sendo discutidos civilmente. Não tem crime nenhum”, disse Ney Moura Teles.
Os advogados não conseguiram prosperar nos vários pedidos de habeas corpus tentados desde a decretação da prisão. O caso chegou a ir ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), quando a presidente do órgão, a ministra Maria Thereza de Assis, negou a solicitação.
Ela avaliou que não houve manifesta ilegalidade do pedido de prisão, pois havia elementos concretos que indicavam “risco à instrução criminal – entre eles, a transcrição de interceptação telefônica em que o empresário teria tentado induzir vereadores de Formosa para intervirem em seu favor nas investigações do Ministério Público”.
A investigação
De acordo com o Ministério Público de Goiás, D’Artagnan Costamilan seria líder de uma associação criminosa formada por outros empresários, agentes públicos e advogados, que se apropriava de terrenos públicos e privados por meio de ameaças e falsificações de documentos.
A apuração de seis meses mirou um grande grupo suspeito de praticar crimes de grilagem, corrupção, falsidade ideológica, uso de documento falso e associação criminosa. O caso chegou ao conhecimento do MP quando o verdadeiro dono de dois lotes de Formosa percebeu uma fraude na documentação de venda das terras.
Segundo a investigação do Ministério Público, D’Artagnan usava do alto poder financeiro para atos de corrupção envolvendo agentes públicos. Um dos exemplos disso foi quando o empresário fez com que três vereadores atuassem “em benefício exclusivo dele em detrimento do interesse público do povo de Formosa”, para conseguir se apropriar de uma área pública.
Vereadores
Para isso, ele teria contado com a participação dos agora ex-vereadores Wenner Patrick de Sousa (Avante), Almiro Francisco Gomes (Podemos), o “Miro Bikes”, e Jurandir Humberto Alves de Oliveira (PSC). D’Artagnan tinha tanta influência política que conseguiu até alterar o Regimento Interno da Câmara de Vereadores de Formosa para criar uma comissão inédita, em dezembro de 2017.
A Comissão de Assuntos Fundiários foi criada, em tese, para promover avanços no contexto imobiliário do município. Na prática, ela era uma “comissão fantasma”, que não produziu “nenhum documento referente aos anos de 2017, 2018, 2019, 2020, 2021, 2023”, como informado pela própria Câmara. O único objetivo desse grupo de trabalho político era destinar áreas públicas para D’Artagnan e sua empresa loteadora, a Nossa Casa.
O fato deixou até o MP surpreso. “Tão logo foi criada a desditosa Comissão de Assuntos Fundiários, a mesma foi provocada para tratar exclusivamente do interesse do investigado D’Artagnan Costamilan nas questões afetas à sua empresa privada. […] Certamente, algo nunca antes visto na municipalidade foi protagonizado pelos investigados.”
Além dos três vereadores que participaram da Comissão, Wenner, Almiro e Jurandir, também se associaram à ela o advogado da Nossa Casa, Nilson Ribeiro dos Santos, o então procurador da Prefeitura de Formosa, Alessandro Oliveira, e Cláudio Thomé, que trabalha como agrimensor, a profissão que determina os limites legais das propriedades, e estaria a serviço de D’Artagnan.
Outro movimento de Alessandro chama atenção. O procurador municipal, que deveria defender os interesses de Formosa, não só participou da comissão fantasma, mas também peticionou ao Judiciário na defesa do interesse de D’Artagnan e contra a cidade.
Como o cartório de 1º Ofício não permitiu que a loteadora Nossa Casa registrasse, de forma ilegal, áreas públicas, Alessando defendeu que o registrador deveria acatar uma manifestação da Comissão de Assuntos Fundiários e fazer esse registro. O MP ainda constatou que essa manifestação não foi produzida por Alessandro, mas pelo advogado privado de D’Artagnan, Nilson Ribeiro, que foi “plantado” na Comissão.
Em outro movimento político que demonstra a influência do empresário foragido, a Câmara Municipal de Formosa promoveu uma Audiência Pública, requerida por Wenner Patrick, para discutir a importância da implementação de um outro cartório na cidade. Isso porque o 1º Cartório vinha passando um pente-fino em documentações e barrando ações ilegais de D’Artagnan. A audiência contou com a presença de Wenner, Alessandro e Almiro, entre outros.
Política, manipulação e abuso do Estado
Não à toa, quando todo o esquema foi descoberto, o MP definiu, no pedido dos mandados: “A criminalidade se entranhou nos órgãos estatais do município”. Um outro vereador, da atual legislatura, também surge em conversas interceptadas.
D’Artagnan e um jornalista conversaram por telefone para combinar a publicação de uma matéria em um jornal da região para “beneficiar e cativar” Índio de Assis, que hoje preside a Comissão de Assuntos Fundiários. O veículo de comunicação do jornalista amigo do empresário publicou matérias positivas sobre a comissão, sobre Índio e sobre o ex-vereador Wenner Patrick.
Fonte: Metrópoles