O período de chuvas intenso vivido em Goiás no verão trouxe alívio aos produtores rurais, preocupação aos moradores ribeirinhos e agora gera expectativa nos gestores de unidades de conservação. No Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, a umidade provocada pelo grande volume pluviométrico ganha atenção por estimular o crescimento da vegetação, material combustível em tempos de estiagem que está começando. Por lá, equipes já estão mobilizadas para evitar que focos de incêndio fujam do controle.
Oficialmente, desde 2017 o PNCV utiliza o Manejo Integrado do Fogo (MIF), uma abordagem de gestão que engloba várias técnicas, buscando um equilíbrio entre a biodiversidade, a proteção do clima e o respeito às comunidades tradicionais. “O fogo é parte da vida das pessoas e nem sempre ele é ruim. Tudo vai depender de como, quando, onde e para que é utilizado”, afirma o analista ambiental do ICMBio, Luís Henrique Neves, chefe do PNCV. Desde a implementação do MIF, a área de alcance de focos de incêndio na Chapada dos Veadeiros tem reduzido.
Luís Henrique explica que até 2017, a cada três ou quatro anos, grandes incêndios ocorriam no parque nacional, que abriga os três tipos de ambientes do Cerrado, o campestre, o savânico e o florestal. “Os dois primeiros aceitam bem o fogo, mas o florestal, não.” Foi a partir desta constatação que o ICMBio decidiu estudar o uso tradicional do fogo na área e imediações e inserir a queima prescrita, técnica de conservação realizada no período chuvoso. “É a técnica mais inovadora porque as demais, como aceiro e queima controlada, já eram adotadas no parque. De janeiro a abril fazemos fogo nas áreas de campo e de Cerrado justamente para proteger as matas e as espécies ameaçadas de extinção, que não podem ser atingidas pelo fogo no auge da seca.”
O MIF não é apenas um conjunto de técnicas, segundo o analista ambiental. “O fogo numa UC no Cerrado é o principal eixo da gestão, é a nossa espinha dorsal. Todos os temas com os quais lidamos no parque nacional têm relação com ele: a pesquisa, o uso público, a regularização fundiária, o voluntariado, a fiscalização e o monitoramento. Enfim, todas as agendas.” É por isso que praticamente durante todo o ano há diagnóstico, planejamento, educação ambiental e ações em torno do seu manejo envolvendo todos os agentes.
Não apenas o Brasil, mas países que enfrentam grandes incêndios florestais como Austrália, Estados Unidos, Portugal e México vêm substituindo a política de fogo zero. “Além de criminalizar o uso de fogo, essa estratégia foi criando regiões com alto acúmulo de combustível para incêndios. E no auge da seca não tinha uma política de prevenção eficaz para segurá-lo.” O chefe do PNCV afirma que, além de ser um elemento da natureza que ao longo dos anos tem moldado paisagens e biomas, o fogo sempre foi usado pelo homem para sobrevivência.
“A política de fogo zero criou conflitos com comunidades tradicionais que usam o fogo para abrir roça, renovar o pasto e extrativismo, como coleta de flores”, explica Luís Henrique. O manejo, que já é uma política nacional, surgiu da percepção dos órgãos ambientais e acadêmicos de que era preciso ampliar o olhar sob o fogo, incluindo a perspectiva social e cultural. A técnica envolve ações de prevenção, preparação para o combate, controle e supressão dos focos de incêndios e a restauração do que foi atingido pelo fogo.
Grupo atua com estratégia unificada
No dia 29 de junho o fogo no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros será o tema central de uma grande reunião em Alto Paraíso de Goiás, como vem ocorrendo desde a implementação do Manejo Integrado do Fogo (MIF). Além dos gestores e servidores do ICMBio, vão participar as brigadas do Centro Nacional de Prevenção e Combate a Incêndios Florestais (Prevfogo), vinculado ao Ibama, Corpo de Bombeiros, brigadas voluntárias e prefeituras da área de abrangência do parque.
“Trocamos contato e informações geoespaciais de áreas que fizemos o manejo, que queimaram no ano anterior e as de maior perigo este ano. . Quando tem uma operação, todos sabem o que precisa ser executado”, detalha Luís Henrique.
Gerente do Centro de Informações Meteorológicas e Hidrológicas de Goiás (Cimehgo), da Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), André Amorim lembra que a redução prematura das chuvas contribui diretamente para o aumento da massa vegetal seca. “Infelizmente este cenário não é nada animador para a propagação das queimadas.”
Fonte: O Popular