O comportamento do ajudante de serviços gerais Marcelo Alves da Silva, de 35 anos, acusado de matar mulher e filho em São Domingos, no nordeste goiano, tanto antes como após o crime, causou estranhamento de parentes e colegas, principalmente pela forma como buscou juntar os recursos financeiros da mulher após os corpos terem sido encontrados. Testemunhas também relataram mudança no semblante em Eliete Carvalho de Jesus, de 30, mulher do suspeito, no dia que antecedeu sua morte.
Marcelo é acusado de colocar fogo na casa em que vivia com Eliete e com o filho do casal, Davi Caetano da Silva, de 2, assim que saiu para o serviço naquele dia para encobrir o crime e simular um acidente, dizendo que foi causado por um curto-circuito, mas a polícia encontrou o corpo carbonizado da mulher com uma faca no pescoço e um produto tipo acetona nos tecidos em que a criança estava envolvida que acelerou o avanço do fogo. Ele foi preso três dias depois.
A reportagem teve acesso à denúncia feita nesta quinta-feira (15) pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) e aos depoimentos das testemunhas ouvidas pela Polícia Civil. Logo após o fogo ter sido apagado, ainda com os peritos na casa, um vizinho disse que o suspeito pediu a ele que entrasse na casa, pegasse o dinheiro que estava em um dos cômodos e guardasse consigo. De acordo com a polícia, eram cerca de R$ 13 mil em espécie.
Pouco tempo depois do enterro das vítimas, quando todos ainda tratavam as mortes como acidente, uma irmã de Eliete foi procurada por Marcelo para que o ajudasse a encontrar a senha do cartão de banco da vítima, pois ele queria transferir para a conta dele os recursos. No dia seguinte, insistiu para que fossem juntos ao banco fazer a transferência. Também pediu que fossem ao mercado em que Eliete trabalhava para providenciar o acerto de contas trabalhistas.
Uma outra testemunha destacou que dois dias após as mortes Marcelo tirou o carro da mulher que ficava na casa da mãe dela e levou para a da sua mãe.
Em relatório remetido ao Judiciário para embasar o pedido de prisão preventiva, a delegada Lucilene Guimarães dos Santos, titular da delegacia de São Domingos, escreveu que o suspeito “demonstrava pressa em levantar todo o dinheiro que conseguisse, (…), tudo isso, desde o dia do enterro dos corpos das vítimas, em nítido desprezo pelas mortes de sua esposa e de seu único filho”. Para ela, era prova de que Marcelo pretendia fugir.
Pizza antes do crime
Ao denunciar Marcelo pelos crimes de feminicídio, homicídio qualificado e ocultação de cadáver, a promotora Ursula Catarina Pinto explica que, de acordo com o que foi apurado, o casal tinha um bom relacionamento, mas o envolvimento do suspeito com jogos de azar, inclusive apostando dinheiro, incomodava Eliete, causando brigas constantes. A mesma informação, mais aprofundada, consta no inquérito, com relatos de pessoas próximas sobre as queixas da vítima.
No dia que antecedeu o crime, Eliete foi trabalhar em um mercado e deixou o filho com a avó dele, como de rotina. Na ocasião, os patrões e colegas de trabalho destacaram que ela estava com semblante muito triste, mas por ser uma pessoa reservada nada foi dito sobre o motivo. Um cliente também estranhou o comportamento da vítima, que, segundo ele, estava “séria, fechada e não brincou como costumava fazer sempre”.
No final da tarde, o casal buscou o filho e retornaram para casa. Durante a tarde ainda, Marcele esteve com o filho na casa de uma irmã, mas nada de estranho foi notado.
Pouco antes das 20 horas, a dona de uma pizzaria recebeu uma mensagem de Eliete pedindo uma pizza, “da maior que tivesse na casa”. Logo em seguida, a comerciante recebeu uma mensagem da vítima, questionando se faziam entregas, o que causou estranhamento pois ela é uma antiga cliente do estabelecimento. Foram enviadas novas mensagens cobrando celeridade e por fim uma ligação foi feita do celular da vítima, durando 11 segundos, mas sem que nada fosse dito.
Quando o entregador chegou na casa, encontrou Marcelo sozinho do lado de fora da casa, na porta, com uma nota de R$ 100. Ele não ouviu nenhum barulho nem viu Eliete ou Davi. O suspeito ainda comentou sobre o frio que fazia naquela noite e após pegar a pizza entrou na residência.
Morte antes do incêndio
A investigação feita pela Polícia Civil constatou que Eliete foi morta uma hora antes do marido deixar a casa para ir trabalhar na cerca de uma fazenda com o sogro em uma fazenda a 25 quilômetros de São Domingos. Devido ao estado do corpo, não foi possível constatar a causa da morte da criança, mas as condições em que foi encontrado indica que também já estava morto quando o suspeito saiu para o serviço.
Algumas situações reforçaram as suspeitas da polícia. A perícia descartou a hipótese de curto-circuito, foi encontrado uma garrafa no quintal com restos de um líquido com cheiro de gasolina e havia um cachorro muito bravo no quintal o que impediu por algum tempo que os vizinhos entrassem para apagar o fogo. Foi necessário entrar um parente para conter o animal.
No dia seguinte, o comportamento de Marcelo chamou a atenção de parentes e amigos. O POPULAR teve acesso aos depoimentos prestados na delegacia. Na ida para o serviço, ele sentou no banco de trás do carro e não do que fica ao lado do motorista, como sempre fez, e ficou em silêncio o trajeto inteiro.
Na volta da fazenda, após ser informado sobre o incêndio, o suspeito ligou para diversas pessoas, menos para a esposa e, segundo o sogro, já dava como certa a morte dela e do filho. No velório, testemunhas estranharam o fato de ele não ter chorado nem demonstrado tristeza pelas mortes.
Marcelo foi preso três dias após o crime. Nas três vezes em que foi ouvido, negou ter matado a mulher e o filho. Na última, ao ser confrontado com as provas coletadas, em especial a faca encontrada com o corpo de Eliete, o suspeito insistiu na sua versão, dizendo que se cometeu algum crime, o “fez dormindo”.
Fonte: O Popular