Em meio a paisagem da Chapada dos Veadeiros, em Goiás, foi realizada de 15 a 18 de maio, a oitava edição do RAÍZES, um encontro de raizeiros, parteiras, benzedeiras e pajés. Desde 2016, o evento é realizado na Vila de São Jorge e em Alto Paraíso de Goiás, e esse ano, contou com mais de 100 mestres de saberes tradicionais vindos de vários estados do Brasil e mais de duas mil pessoas, entre eles voluntários, apoiadores e simpatizantes.
Uma equipe da Fiocruz participou do encontro, por meio do Projeto de Prospecção Fiocruz Cerrados, coordenado por Guilherme Franco Netto da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS/Fiocruz). Também estiveram presentes a Fiocruz Brasília e o Canal Saúde.
Para Francyslane Vitória da Silva, que atua no Programa de Promoção da Saúde, Ambiente e Trabalho (PSAT) da Fiocruz Brasília, o Raízes representa um espaço de fortalecimento das práticas de cuidado em saúde que não segue o modelo hegemônico. “São práticas que brotam da terra, do corpo, da vivência, da sabedoria popular. É resistência, é cura, é comunidade, e é uma forma de não deixar morrer esses saberes”, afirmou.
Na avaliação de Denise Cidade Cavalcante, também do PSAT, o evento possibilita o encontro entre culturas e gerações, fortalece a rede de cuidados, amplia as possibilidades de mapear experiências e identificar atores dos territórios, e permite estabelecer parcerias. “Minhas avós faziam chás e garrafadas e participar do evento reativou minhas memórias”, contou.
Plantas-símbolo – O encontro Raízes reúne uma diversidade de vozes e saberes em torno das Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS). Em cada edição, os mestres escolhem uma planta medicinal para reafirmar a importância da biodiversidade do Cerrado e integrar todas as trocas de saberes do encontro. A planta escolhida é o algodãozinho do cerrado (Cochlospermum regium), subarbusto com flores amarelas e sementes envoltas em uma paina, semelhante ao algodão. A catuaba, sucupira, jatobá, copaíba, buriti, barbatimão e velame-branco foram as plantas escolhidas nas edições anteriores.
Benzimento – São cerca de 40 atividades e o benzimento nas corredeiras foi uma das mais procuradas. A atividade aconteceu no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros – PNCV, um parque reconhecido como Patrimônio Mundial Natural pela Unesco, considerado um santuário ecológico que abriga uma rica biodiversidade e formações geológicas. A valorização das benzedeiras e de suas práticas no evento ressalta a necessidade de preservar esses saberes como um patrimônio cultural imaterial.
Maria Bezerra, benzedeira e criadora da Escola de Almas Benzedeiras de Brasília, em 2017, decidiu seguir os passos da avó, que também era benzedeira. Atualmente, o grupo da Escola, realiza encontros que acontecem em postos de saúde e parques da cidade, com atendimentos gratuitos.
Quanto ao RAÍZES, Maria conta que, desde 2018, o grupo se mobiliza para levantar recursos para a realização do evento e, durante o evento, também atuam como voluntárias sendo guardiãs dos mestres e fazendo benzimentos. “Que esse evento sirva de inspiração para as futuras gerações e para que fortaleça cada mestre em suas comunidades e percebam a força desse coletivo, da reza, da energia da natureza (…). Aqui é um espaço de reconexão e reverberação”, afirmou.
A enfermeira e parteira indígena, Lua Ayré, participou da roda “Raizeiros, Parteiras, Benzedeiras e Pajés no âmbito do SUS” e disse que as ciências (tradicional e a ancestral) precisam se unir, cada uma contribuindo com soluções e o avanço do conhecimento. “A ciência indígena, que é a das ervas, vem para unir”, destacou.
A saída de campo para identificação de plantas medicinais do Cerrado, na Fazenda Volta da Serra, entre Alto Paraíso de Goiás e São Jorge também reuniu diversas pessoas que caminharam até o Poço Esmeralda. Essa atividade é guiada por raizeiros e benzedeiras, que compartilham seus saberes sobre o uso ancestral das ervas em práticas que buscam o cuidado com a saúde.
O evento terminou no domingo (18), com a feira de produtos naturais, ervas e artesanato na Praça do Encontro, em Alto Paraíso.
