Em Goiás há atualmente pelo menos 484 obras paradas, o que corresponde a um investimento de R$ 1,34 bilhão de recursos federais que foram destinados ao Estado ou a municípios goianos para a realização de benfeitorias para a população, mas com nenhuma perspectiva para serem entregues nos próximos meses. Os números constam no relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) que é realizado a cada dois anos e está em sua terceira edição. Deste montante, R$ 448,4 milhões já foram utilizados nas construções, que se encontram em situação de deterioração pela paralisação das obras e desgaste dos materiais utilizados.
Na tarde do dia 20 de agosto do ano passado, o prefeito Rogério Cruz (Republicanos) levou os então ministros João Roma (Cidadania) e Gilson Machado Neto (Turismo) e os ex-secretários Mario Frias (Cultura) e André Porciúncula (Incentivo e Fomento à Cultura), que estavam em visita a Goiânia, na Rua Juliano Rivas Moraes, no Residencial Buena Vista IV, região Oeste da capital. Eles inauguraram a Praça dos Esportes e Cultura (PEC) no local, que estava na época com cerca de 80% de conclusão. A obra foi paralisada pouco depois.
A construção da praça foi iniciada em 2013 e tem longo histórico de paralisações até ter sido retomada pela última vez em 2019, com previsão de entrega em 2020. O relatório do TCU aponta que a PEC do Residencial Buena Vista IV está parada por dificuldade técnica do tomador, ou seja, da Prefeitura de Goiânia que foi a responsável por realizar o projeto e receber o recurso federal. A praça está 82,25% finalizada e teve o custo estimado em R$ 3.861.631,38, sendo que R$ 2.603.568,93 já foram desbloqueados. A situação da obra também foi alvo de investigação pela Controladoria-Geral da União (CGU) em junho deste ano.
O documento da CGU apontou ainda o abandono da obra da Praça PEC, cujo mobiliário foi todo saqueado, o que ocorreu também com luminárias, fiação e estruturas como portas e janelas. A Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seinfra) explica que a empresa que havia sido contratada em 2019 desistiu da obra quando ela estava 88% concluída. “A Seinfra já autorizou uma empresa a fazer o levantamento do remanescente da obra para a aquisição de material necessário para sua conclusão. A retomada será imediata após este levantamento e compra do material”, informa, sem estimar uma data.
A situação é bem semelhante com o que ocorre em outra praça do tipo PEC, que são projetos do governo federal de 2010, com o objetivo de implementar espaços de cultura e lazer com cerca de 7 mil metros quadrados nas cidades brasileiras. Esta também foi iniciada em 2013 e com histórico de paralisações com retomada em 2019, mas no Setor Jardins do Cerrado I, na Rua da Liberdade com Rua Angra dos Reis. No entanto, neste caso, o relatório feito pelo TCU considera que a obra está em execução, com realização de 67,77% do projeto orçado em R$ 3.541.657,13, sendo que R$ 2.382.010,82 já foram desbloqueados pelo governo federal ao longo dos anos. Porém, a Seinfra informa que a empresa desistiu da obra quando 62% estavam concluídos.
Da mesma forma que a PEC do Residencial Buena Vista IV, a obra no Jardins do Cerrado I, de acordo com a Seinfra, já teve a autorização de retomada feita pelo prefeito Rogério Cruz. Neste caso, a secretaria também autorizou uma empresa a fazer o levantamento do remanescente da obra para a verificar a compra de material necessário para sua conclusão e a continuidade do serviço se dará após esse trabalho. Não foi informado se, em ambos os casos, será realizada uma nova licitação para o término da obra ou se a administração optará pela contratação da Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg), por exemplo, o que tem ocorrido em algumas situações na capital, como na Praça do Trabalhador.
Ressalta-se que o relatório do TCU, divulgado no final de novembro, é baseado em dados coletados em agosto deste ano. O documento aponta a existência de um total de 951 obras com recursos federais em Goiás, o que demonstra que 50,9% delas estão paradas, inacabadas ou não, sendo o maior índice entre todas as pesquisas realizadas. A maior parte dos problemas está na área de educação, com 135 construções sem serem finalizadas, seguida pela infraestrutura e mobilidade urbana, com 55, e o turismo, com 38.
No levantamento anterior a este, de outubro de 2020, o número de obras paralisadas era de 422, sendo que havia 1.275 projetos de construções utilizando recursos federais no Estado, ou seja, a relação era de 33,1% entre obras sem perspectiva e aquelas em execução. O primeiro relatório do TCU sobre obras paradas, em 2018, identificou 1.538 projetos em Goiás, sendo 666 parados, uma relação de 43,3%. No entanto, nesta época, a somatória dos recursos utilizados nestas construções paralisadas chegavam a R$ 4,5 bilhões, valor muito acima dos atuais R$ 1,34 bilhão e ainda mais do R$ 1 bilhão que foi identificado na situação encontrada em 2020.
Licitação do Trecho I do BRT fica para 2023
O relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) que identificou como paradas pelo menos 484 obras que utilizam recursos federais em Goiás aponta, entre elas, o Trecho I do BRT Norte-Sul, que compreende o corredor exclusivo para transporte coletivo entre os terminais Isidória, no Setor Pedro Ludovico, e Cruzeiro do Sul, em Aparecida de Goiânia. O projeto é um dos 23 na capital que estão listados no documento da entidade, sendo a cidade goiana que lidera o levantamento. O trecho citado está parado desde novembro de 2021, com 2,21% executados, de acordo com o documento.
Na época, houve desistência da empresa contratada para realização das obras, orçadas em R$ 78.665.411,15, e a promessa de que uma nova licitação seria realizada no começo de 2022. A previsão foi sendo modificada ao longo do ano e passou a ser prevista para este mês. No entanto, a Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana (Seinfra), responsável pela contratação, informa que “o novo cronograma de obras do Trecho I do BRT está em fase final de análise por parte da Caixa Econômica Federal”. Com isso, a previsão de lançamento do edital deve ocorrer em janeiro de 2023, “em razão das demandas do Ministério de Desenvolvimento Regional e da Caixa”.
Além disso, em junho deste ano foi contratada a empresa Quintal Projetos e Obras Eireli com o objetivo de elaborar e revisar os “projetos complementares das estações de embarque e desembarque, memorial descritivo e atualização da planilha orçamentária” do Trecho I do BRT Norte-Sul, por seis meses, mas com prazo de execução do serviço em dois meses. No entanto, no começo deste mês, dois dias antes do contrato encerrar, a Seinfra assinou aditivação no acordo por mais seis meses. O preço inicial de R$ 87 mil ganhou acréscimo de R$ 19 mil.
A situação indica a necessidade de maior prazo em relação ao que foi previsto inicialmente para finalizar o termo de referência para a licitação da construção do Trecho I, o que deve manter o serviço parado por mais tempo. Esta parte da obra foi desmembrada do Trecho II, que compreende o corredor entre os terminais Isidória e Recanto do Bosque, após um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado com o Ministério Público Federal (MPF) no primeiro semestre de 2018, que serviu para a retomada da construção que estava parada.
Na época, o acordo era de readequação orçamentária, o que só poderia ser feito no Trecho II por ser realizado via financiamento junto a Caixa Econômica Federal, enquanto que o Trecho I tem verba direta do Orçamento Geral da União (OGU). Com isso, o trecho em questão foi desmembrado para uma licitação à parte, que só poderia ocorrer no fim de 2020, com a finalização do corredor que já estava em obras, justamente o Trecho II. Houve anuência para a realização da licitação do outro trecho devido ao andamento das obras na época, previstas para serem finalizadas em dezembro daquele ano, o que ainda não ocorreu.
A Seinfra relata que, em março de 2022, foi realizada uma audiência com o MPF e a Caixa Econômica Federal para traçar as metas sobre Trecho 1. Entre as alterações estão a correção do projeto executivo para a retirada da construção do terminal dos Correios; alteração do posicionamento dos cabos de fibras óticas na Avenida Rio Verde; distrato com a empresa que ganhou a licitação e paralisou as obras do Trecho 1; realização de um novo orçamento, edital e termo de referência. É esse o processo que está sendo feito atualmente para a realização de novo processo licitatório. Ainda de acordo com a Seinfra, o Trecho II do BRT está 96% concluído e tinha previsão de entrega da obra física neste ano, mas deve ficar para março de 2023.
Estado é 3º em números relativos
As 484 obras listadas como paradas em Goiás pelo relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) colocam o Estado como o terceiro do País com mais projetos nesta situação em relação ao total de construções contratadas com recursos federais. Neste quesito, há 50,9% das obras em Goiás, enquanto que no Pará a relação é de 53,5% e no Tocantins é de 52,6%. No número absoluto, o Estado é o sexto do Brasil. Quem lidera o ranking dos estados pelo levantamento do TCU em quantidade de obras sem continuidade é o Maranhão, com 905, seguido pela Bahia (807), Pará (671), Minas Gerais (657) e Ceará (577).
A sexta posição é a mesma com relação aos valores gastos em empreendimentos que estão paralisados. Mas neste caso a liderança é de São Paulo, com R$ 3,1 bilhões de recursos federais investidos em obras sem andamento. Na Bahia, o recurso nesta situação é de R$ 2,5 bilhões e em Minas Gerais é de R$ 2 bilhões, em seguida estão Pará (R$ 1,8 bilhão) e Pernambuco (R$ 1,7 bilhão). Goiás está com a mesma situação do Amazonas, com R$ 1,3 bilhão de recursos de financiamentos ou programas federais utilizados nestas obras que estão paradas.
No geral, em todo o Brasil, o levantamento feito pelo TCU verificou a existência de 8.674 obras paralisadas, dentre as 22.559 iniciadas com os recursos federais que ficarão de herança do governo atual para o próximo mandatário, ou seja, 38,5%. Este total soma um montante de R$ 116,86 bilhões, sendo que R$ 27,6 bilhões estão em construções sem andamento. O valor é maior do que o encontrado em 2020, quando se tinha R$ 15,8 bilhões investidos em 7.862 obras paradas, que na época representava 29% do total.
Fonte: O Popular