Amigos e familiares do agente da Polícia Federal Lucas Soares Dantas Valença, o “Hipster da PF”, tentaram leva-lo para uma clínica psiquiátrica horas antes de ele tentar invadir uma residência em Buritinópolis, no nordeste goiano, e ser morto aos 36 anos com um tiro no peito pelo dono do imóvel, na noite do dia 2 de março. Os depoimentos que confirmam esta versão constam no inquérito remetido à Justiça nesta terça-feira (12).
A Polícia Civil manteve o auxiliar de almoxarifado Marcony Pereira dos Anjos, de 29 anos, livre do indiciamento por homicídio por concluir que ele agiu em legítima defesa. Após um tempo gritando e ameaçando a família dele, Lucas em aparente surto psicótico teria desligado a energia da casa e ao abrir a porta no chute foi atingido por um disparo de uma espingarda de pressão modificada para calibre 22. O agente da PF morreu no local.
Na tarde do dia 2, três amigos da PF e dois policiais militares chegaram a ir numa unidade de saúde pública de Buritinópolis em busca de atendimento para Lucas, que estava na chácara bastante alterado, mas ao serem informados de que precisavam garantir um meio para dar segurança de quem fosse aplicar o medicamento, saíram de mãos vazias.
Ainda naquela tarde, o agente da PF chegou a ser medicado e colocado no carro destes amigos, que saíram mais cedo de Brasília para leva-lo a uma clínica na capital federal, mas ao acordar no veículo, chutou a porta e saiu com o carro ainda em movimento, voltou para o banco de trás, agressivo, ameaçou os amigos se não voltasse para a chácara e foi deixado na entrada da propriedade. Os amigos afirmaram em depoimento que ele era muito forte e hábil, e com o comportamento alterado, era praticamente impossível imobilizá-lo.
Lucas estava em uma chácara da família na região de Buritinópolis desde 25 de fevereiro. Foi neste dia que o comportamento dele começou a mudar. Segundo a família, ele levou um cachorro adotado recentemente para o local e o que já estava lá com a mãe e o padrasto o estranhou, iniciando uma briga. Nervoso, o agente teria reagido com uma violência excessiva contra o cachorro da casa e desde então não voltou a se acalmar.
Nos dias seguintes, o agente seguiu “muito sensível, emotivo” e “difícil de conversar”. Com o tempo, foi também ficando mais violento, chegando a quebrar alguns móveis e objetos da chácara. O irmão do agente entrou em contato com três amigos de Lucas, que foram para Buritinópolis no dia 2, uma quarta-feira.
Os familiares afirmaram em depoimento que Lucas não agrediu ninguém neste tempo que esteve em surto, mas “se manifestou de forma não-normal”, ofendendo as pessoas, questionando muito, “com voz forte, quase encostando no nariz” da outra pessoa ao se dirigir a ela, de uma forma que nunca foi visto antes. Em um determinado momento, ele chegou a falar que o pai dele, falecido quando o agente ainda era criança, estava na chácara.
De terça para quarta-feira, Lucas dormiu sozinho na chácara. Um parente que retornou ao local pela manhã disse que foi proibido de entrar e que o agente dizia só liberar se ele tirasse a sandália, pois ali era “a casa de Deus”. Menções religiosas também foram ouvidas por Marcony e sua esposa à noite quando Lucas estava na porta da residência deles.
Antes de ser levado para o carro pelos amigos, Lucas chegou a disparar tiros de uma submetralhadora da PF em sua posse, porém a esmo. Os amigos conseguiram desarmá-lo, desmuniciar a arma e outras duas que estavam na chácara e, segundo eles, guardar tudo em um local seguro.
Ninguém soube dar um motivo para Lucas ter ido da chácara até a casa de Marcony. Ele passou horas agitado no quintal da residência, fazendo ameaças, cuspindo e gritando. Um detalhe surgiu após as oitivas: a mulher de Marcony já trabalhou para a mãe de Lucas, na chácara, e ligou para ela naquela noite perguntando se tinha um filho e se ele estava agitado naqueles dias, contando o que aconteceu. Entretanto, antes que a família do agente conseguisse tomar alguma providência, ele tentou invadir a casa e foi baleado.
Todos os amigos e familiares de Lucas que tiveram contato com ele naqueles dias e depuseram na delegacia afirmaram acreditar que Marcony agiu em legítima defesa, por saberem da força do agente e de como ele estava agressivo naqueles dias.
Indiciamento
Apesar de não ter sido acusado pelo homicídio, Marcony segue respondendo por porte ilegal de arma, já que não tinha permissão para o uso da espingarda. Ele chegou a ser preso por isso no dia, mas após pagar uma fiança passou a responder em liberdade.
O inquérito foi remetido ao Judiciário e será analisado pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO).
Fonte: O Popular