Afastamentos por Covid-19 ou gripes, as más condições das estradas e o alto custo do transporte rodoviário já tiraram quase 50% dos caminhoneiros das estradas. A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Terrestre e em Logística (CNTTT) estima que 30% dos empregados no setor já tenham sido afastados por conta de síndromes gripais nas últimas semanas. O Sindicato dos Transportadores Autônomos de Carga de Goiás (Sinditac) estima que mais de 50% dos caminhoneiros já tenham parado os caminhões, o que pode gerar até risco de futuro desabastecimento de alguns produtos.
“Os afastamentos por Covid ocorrem em todas as atividades e conosco não é diferente. Tem muita gente doente”, diz o presidente do Sinditac, Vantuir José Rodrigues. Ele lembra que os caminhoneiros geralmente têm a imunidade mais baixa, pois não se alimentam e nem dormem direito. “Já perdemos muitos companheiros para este doença, que não quiseram parar de trabalhar, mesmo doentes, para não perderem serviço e renda”, ressalta.
Vantuir estima que metade dos cerca de 49 mil profissionais no estado não estejam rodando por problemas de doença e pelo alto custo atual do transporte de cargas. “Pode começar a faltar produtos no País, pois nossa base do transporte de mercadorias é basicamente rodoviária”, alerta. Além da alta dos combustíveis, o custo dos fretes também foi elevado pelas péssimas condições de muitas rodovias após o período chuvoso, que provocam avarias nos caminhões.
Afastado do trabalho há uma semana após testar positivo para a Covid-19, o caminhoneiro autônomo Luiz César Nunes da Silva, que transporta combustível, fala da dificuldade de ficar parado. “Temos muitos compromissos e ficar sem trabalhar é muito complicado. Ouvi falar hoje que já são mais de 80 mil caminhoneiros parados no País”, diz Luiz, que já havia tomado as duas doses da vacina.
Também parado, o caminhoneiro Benedito Luiz Rosa reclama dos altos custos que estão inviabilizando o trabalho dos autônomos hoje, como o preço dos combustíveis e os gastos com a manutenção dos caminhões. “Tudo está muito mais caro, como pneus e peças em geral, que dobraram de preço. O valor do frete não acompanha e não temos nenhum apoio dos governos. Cada vez mais caminhoneiros vão parar”.
Para o presidente da CNTTT, Jaime Bueno Aguiar, que também preside a Federação dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários em Goiás e Tocantins (Fettransporte), o impacto sobre o setor é grande, assim como ocorre em praticamente todas as atividades econômicas. Ele conta que está em contato permanente com todas as federações nacionais e estima que cerca de 30% da categoria já tenha sido afetada pela contaminação por gripe ou Covid-19, com o afastamento do trabalho nos últimos dias.
Mesmo assim, ele não acredita que isso possa gerar algum risco de desabastecimento de produtos, como tem acontecido nos Estados Unidos, por exemplo. Isso porque o brasileiro consome muito mais produtos in natura, que são produzidos no próprio estado, além do fato de Goiás ter muitas agroindústrias. “Pelo menos no caso dos alimentos, não corremos este risco”, estima.
Prejuízos
O presidente da Federação Interestadual de Transporte de Cargas (Fenatac), Paulo Afonso Lustosa, confirma que todas as empresas do ramo enfrentam este crescimento da contaminação, que afeta até os líderes do setor. “Tínhamos um compromisso marcado para hoje, mas quatro das três lideranças testaram positivo para Covid”, informa. O resultado, segundo ele, tem sido a perda de muitos trabalhos, já que não é possível substituir a mão de obra afastada. “Esta falta de motoristas é um problema mundial, e não apenas no Brasil”, destaca.
O problema é ainda maior no Brasil porque aqui já existe uma redução da oferta de motoristas por conta de problemas como a má conservação e a violência das estradas. Apesar do grande índice de afastamentos, Paulo Afonso ainda acredita que o sistema de transportes do País possa suprir a demanda. “Se tivermos problemas de falta de produtos, serão pontuais”, prevê.
No atacado e varejo, ainda não há sinais de desabastecimento
Apesar do alto índice de afastamentos de motoristas de cargas dos volantes, no atacado e varejo ainda não há sinais de falta de produtos. É o que garante o presidente Sindicato do Comércio Atacadista, Distribuidor e Atacarejo no Estado de Goiás (Sinat), Paulo Diniz. Segundo ele, o maior problema do setor é a falta de colaboradores próprios, já que houve um significativo aumento do número de afastamentos por contaminação por gripes ou Covid-19 nos últimos dias.
Para ele, o maior problema é que os sintomas apresentados hoje são mais leves que antes, o que leva a pessoa a pensar que se trata apenas de uma ‘gripezinha’ e a continuar trabalhando e ampliando a contaminação no ambiente de trabalho. O setor também já prevê que esta última alta no preço do diesel vá se refletir diretamente no custo do frete das mercadorias, elevando os preços dos produtos. “Acho que esta é uma situação temporária e que logo tudo deve se normalizar”, acredita Paulo.
Vendedores do comércio atacadista ouvidos pela reportagem informaram que muitos produtos já estão com tendência de alta nos próximos dias. O presidente da Associação Goiana de Supermercados (Agos), Gilberto Soares, também confirma que ainda não há sinais de desabastecimento, como ocorre em outros países. Porém, ele ressalta que alguns produtos já têm mais dificuldade de oferta por conta das condições climáticas, ou seja, do excesso de chuvas nas últimas semanas.
“Já existe uma certa dificuldade para comprar vários produtos na Ceasa de Goiás”, destaca. Segundo o presidente da Agos, além de dificultar a produção e a colheita nas lavouras, o excesso de chuvas também deixou muitas estradas e rodovias intransitáveis e derrubou pontes, obrigando os caminhões a fazerem longos desvios, o que dificulta o transporte e encarece o frete do campo até as cidades. “A manutenção dos caminhões também é constante em condições como estas”, reconhece.
Outro problema foi a queda na qualidade de alguns hortifrutigranjeiros por conta do grande volume de chuvas. Mesmo com tantos problemas, Gilberto também não acredita na possibilidade de desabastecimento, só na ocorrência de problemas pontuais em alguns produtos. “A maior consequência mesmo deve ser a alta dos preços no mercado”, alerta.
O setor de transportes ainda enfrenta rumores de uma greve dos caminhoneiros, depois da Petrobras anunciar o novo reajuste de 8,08% no preço do diesel, que passou a vigorar ontem. Mas o próprio presidente da Associação Brasileira de Condutores de Veículos Automotores (Abrava) e líder da paralisação em 2018, Wallace Landim, mais conhecido como Chorão, já descartou uma paralisação diante da atual situação do País. Segundo ele, a categoria reconhece que a população já está sofrendo muito com as altas de preços e as novas gripes. Porém, outros líderes declamaram esta semana que o trabalho está ficando cada vez mais inviável e não descartam uma nova mobilização.
Fonte: O Popular