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Alunos quilombolas se espremem em salas pequenas e sem banheiro, enquanto obra de escola está abandonada há 10 anos, em Arraias-TO

Salas com mofo nas paredes, piso de cimento batido, sem banheiro e turmas de séries diferentes ocupando o mesmo espaço. Essa é a realidade que quem se esforça para estudar vai encontrar na escola da comunidade quilombola do Kalunga, em Arraias, no sudeste do Tocantins.

População remanescente espera há 10 anos que obra de escola seja entregue na região.

A Prefeitura de Arraias disse que a obra começou em gestões anteriores, que identificou as pendências da obra e que tem o compromisso de concluir a obra ainda em 2023.

A Secretaria de Educação do Tocantins disse que nos próximos dias deve começar a reforma da escola e a construção de banheiros.

Dos pequenos aos mais idosos, que também frequentam a escola, todos tentam aprender cada dia um pouco das letras e números. Aos 69 anos, o motorista Edi Alves Moreira, nascido e criado na região, não teve a oportunidade de estudar quando era criança.

“Eu não tive a oportunidade de estudar. As vezes até eu tava aqui, mexia com o gado e ia pro pastoreiro. A filha dele passava uma letrinha pra mim no papel, eu levava no bolso da camisa e lá no pastoreiro, quando o gado malhava, eu ia desenhar as letras”, contou o idoso. Que não quer o mesmo destino às crianças da comunidade.

A escola tem atualmente 60 alunos. Apenas três salas abrigam todas as turmas, desde a alfabetização até o novo ano do ensino fundamental.

São poucos espaços, com muitos problemas: as salas de aula não têm forro e é possível ver os buracos no teto, por onde a água passa quando chove. Nas paredes mofo, pintura acabando e fiação exposta. Para ir ao banheiro, o jeito é procurar o mato, porque o banheiro não tem nem privada, só um buraco no chão. Por isso foi interditado.

A lavradora Lerinda dos Santos, mãe de uma das crianças que estuda na escola, há momentos em que a situação é pior e as aulas acontecem debaixo de um pé de manga por falta de espaço na sala de aula.

“Não tá a turma toda, tá faltando ônibus escolar aqui hoje. Se tivesse todo mundo aqui a turma tava lá debaixo do pé de manga”, disse a mãe.

Com todos os contratempos, a professora Valdirene dos Santos, que atua na escola, não desiste. “Eu busco uma aula diferenciada pra ele, pra que ele possa aprender brincando. Pra motivar ele a vir. ‘Não, hoje a aula hoje foi interessante. Amanhã eu venho tia’, isso pra mim é uma satisfação imensa”, contou.

Denúncia

Diante de tantos problemas para ter um direito garantido por lei, que é a educação, as lideranças Kalunga, por meio da Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins, denunciaram a situação da escola ao Ministério Público Estadual (MPE)

“Entramos com essa ação. Já tem um bom tempo que nós entremos com essa ação no Ministério Público. Só que a gente não tem a resposta concreta em resolver o problema. E tamo nisso até hoje. Só tem promessa” disse Edi Soares, presidente da associação Kalunga do Mimoso.

O Ministério Público disse que vai apurar as condições da escola e que aguarda informações dos órgãos de Educação sobre a situação.

Uma nova estrutura para a escola da comunidade está sendo construída e a boa notícia é que vai conseguir atender turmas desde a alfabetização até o ensino médio. A má notícia é que essas obras já têm dez anos e a escola nunca foi entregue.

E tem notícia pior ainda: com tanta demora e a ação do tempo, parte do telhado da nova escola já quebrou. Quem doou o terreno para essa obra foi o pai do lavrador Eremito Rosa. Mas demorou tanto que o doador morreu e não teve o sonho de dar mais educação para as crianças da comunidade realizado.

“A gente não acha bom não, com certeza. A gente doou pra ter né. Mas pra modo de não ter, não adianta né?”, lamentou o lavrador.

Educação fora

Três dos quatro filhos da lavradora Lucineide Soares tiveram que deixar a comunidade para estudar fora. Agora ela luta pra que a mais nova, de cinco anos, consiga ser educada perto das tradições e a cultura dos quilombolas.

“Desde os nossos antepassados, a gente sempre lutou. Permaneceu nas terras para dar continuidade e a gente estar aqui com eles. A gente vê os nossos filhos indo embora, a terra ficando vazia e a gente não quer isso. A gente quer que eles evoluam junto com a gente”, afirmou a lavradora.

O povo Kalunga já enfrentou muitas lutas desde a época em que seus antepassados enfrentaram a tristeza da escravidão. E segue em luta para que os jovens tenham oportunidades justas.

“A gente tem o que hoje né? Com tudo? Com uma escola lá daquele jeito e com as crianças estudando aqui? Hoje o que a gente quer é uma sabedoria boa para os filhos da gente”, completou a lavradora Lerinda, com lágrimas nos olhos por lamentar a situação da educação na comunidade.

O que diz a Secretaria Estadual de Educação

A Secretaria de Estado da Educação informa que o processo de intervenção na unidade foi iniciado e a reforma e a construção de banheiros serão realizadas nos próximos dias.

O que diz a Secretaria Municipal de Educação

Primeiramente cabe ressaltar que a obra da Escola Polo Matas foi iniciada em 2010, por meio do convenio 702592/2010, e que a gestão atual tomou posse no ano de 2021, assim já constava esse termo de compromisso firmado entre o município e o governo federal e a obra já constava como paralisada.

A administração buscou esclarecimentos do status da obra, que constava 68.64% de obra concluída, identificou que constava pendências de documentos nos arquivos da prefeitura, fizemos um relatório da execução financeira e identificamos diversas irregularidades na organização da documentação e a impossibilidade de conclusão da obra inacabada, sendo necessário medidas jurídicas cabíveis e responsabilização das gestões anteriores, pois se o prefeito atual desse andamento na obra assumiria as responsabilidades dos ex-gestores.

Além dessas providências, foram feitos laudos de engenharia para verificação do cumprimento do objeto da obra para que a partir do mesmo possa ser feito uma nova licitação da obra, que deve ocorrer até abril, após os tramites legais de responsabilização/judicialização.

Dentre as tantas providências, o prefeito Herman visitou o FNDE a fim de buscar mais esclarecimentos sobre a obra e de tal forma dar continuidade a mesma, mas além da necessidade de judicialização da obra, não havia mais recursos em conta para dar andamento e de tal forma o prefeito já conseguiu com um parlamentar cerca de 300 mil para finalizar a obra vez que a mesma encareceu pelo tempo que a obra ficou paralisada e deteriorada, já foi empenhado o recurso e agora esperamos que chegue na conta para executar a conclusão da escola.

A gestão atual encontrou também em péssimas condições (tanto de infraestrutura física como de recursos pedagógicos) as 11 escolas municipais, porém já estamos na reforma da 4ª escola e bem como mobilizamos e fizemos melhorias em cada uma delas.

A escola quilombola em funcionamento faltava o básico, como carteiras, professores formados a nível superior e por área, materiais de utensílios de merenda escolar e eletrodomésticos que fizemos aquisição tais como freezer, bebedouro, liquidificador industrial e fogão forno industrial entre outros, como a reposição de todas carteiras e mesas.

Também não havia internet e fizemos instalação assim como conseguimos 40 computadores (porém sem instalar pela falta de espaço), ampliamos a frota de transporte escolar, melhoramos a qualidade da merenda escolar e contratamos professores qualificados para atender os alunos, porém ainda enfrentamos dificuldades em relação a contratação de professor de Matemática (pois há uma carência na região e os poucos que tem preferem a área urbana para trabalhar).

Há um compromisso da gestão atual de concluir a obra ainda em 2023, no segundo semestre e assim a tão sonhada escola Polo da região Matas possa cumprir, de fato, sua finalidade e os estudantes ter uma escola digna e não estamos medindo esforços para que tudo se conclua o quanto antes.

Carla Araújo Martins dos Santos Cordeiro – Secretária Municipal de Educação de Arraias

O que diz o Ministério Público

Sobre a representação encaminhada ao MPTO acerca da situação de precariedade das escolas rurais da Comunidade Quilombola Kalunga do Mimoso, o Ministério Público do Tocantins informa que existe procedimento instaurado para apurar e acompanhar a situação e que, no último dia 10, requisitou novas informações à Secretaria Municipal de Educação de Arraias e à Diretoria Regional de Educação a respeito das providências adotadas em face das deficiências identificadas na infraestrutura escolar e dos recursos materiais da Escola Municipal Eveny de Paula e Souza.

Fonte: G1

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